quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Quem quer pão?

Existem coisas que são a cara da Zona Norte. Uma delas é o Pão de Cristo, espécie de corrente que circulou por aqui cerca de 15 anos atrás, se não me engano. É possível que a idéia tenha vindo de ou se espalhado para outros lugares. Mesmo assim, o tal pão tem tudo a ver com o modo de ser do suburbano.

O Pão de Cristo é um preparado líquido que quem recebe, divide e passa adiante. Pode ser para um amigo, parente, vizinho, não importa, desde que não quebre a corrente. O líquido que se distribui consiste em um fermento ao qual são acrescidos alguns ingredientes antes de separá-lo em três partes iguais: uma para entregar a alguém, uma para manter em casa e continuar o fermento, e outra para usar na receita.

Há, portanto, toda uma simbologia envolvendo a história. Não se trata apenas de preparar uma receita de pão para o café da manhã, mas de repartir a base do alimento com o próximo, multiplicar o pão, coisas nobres desse naipe. Foi com essa idéia que as pessoas começaram a trocar o Pão de Cristo entre si. Geralmente, o preparado era entregue em um vidro, como aqueles antigos de tampa laranja da maionese Hellmann's. O fermento líquido costumava estar acompanhado de uma folha com a receita escrita à mão.

Então das casas do Engenho de Dentro, Encantado e arredores começaram a sair fornadas de Pão de Cristo que, além de render uma enormidade, é uma delícia. Nas redondezas, o pão logo se tornou o assunto das moradoras e o astro da hora do lanche. Animadas com o resultado e a facilidade no preparo, as donas-de-casa passaram a investir em variações, imprimindo seu toque pessoal para distribuir para as amigas e vizinhas não mais apenas o fermento líquido, mas também os pães prontinhos, já assados.

Presenciei uma dessas trocas entre minha avó e uma vizinha. Lembro como se fosse hoje da animação da senhora ao mostrar uma forma de bolo inglês que acabara de comprar, pois queria assar o Pão de Cristo como pão de forma. Fiquei impressionada com aquilo, no prédio de três andares onde minha avó morava quase todas as vizinhas estavam participando da corrente. Também na minha casa o Pão de Cristo se tornou presença certa. Quando não encontrou mais ninguém que desejasse receber o preparado, minha mãe continuou a fazer a divisão do fermento líquido, mas ficava com as três porções, e assava os pães, e por vezes os oferecia também para outras pessoas, até que cansou. Verdade é que o Pão de Cristo fez muita gente incorrer no pecado da gula. Eu, inclusive.


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P.S.: Caso alguém se interesse por experimentar o Pão de Cristo, deixo aqui uma receita que encontrei na internet e ensina a começar até mesmo o fermento líquido que se recebe.


Pão de Cristo

Fermento natural:
Misture 1/2 litro de água
2 colheres (sopa) de farinha de trigo sem fermento
2 colheres (sopa) de açúcar
1 pitada de sal.
Cubra com pano branco e deixe fermentar por dois ou três dias.

Ritual:
Caso você ganhe o fermento, logo ao receber acrescentar 1 litro de água e cubra com um pano branco, deixando em lugar fresco.
No dia seguinte, acrescente:
5 colheres (sopa) de farinha de trigo
5 colheres (sopa) de açúcar
1 colher (sobremesa) de sal.
No terceiro dia, mexa bem o fermento e divida em três partes iguais:
uma será dada a alguém.
a outra mantida em casa para continuar o fermento
a terceira será usada na receita.

Pão:
Ingredientes:
19 colheres (sopa) de açúcar cristal
4 ovos
1 copo de óleo (200 ml)
1 kg e 100 g de farinha de trigo
1/2 litro de fermento natural
4 colheres (sopa) de fibra de trigo (opcional)
100 g de passas (opcional)

Preparo:
Misture ovos, açúcar, óleo e o fermento.
Junte a farinha de trigo.
A massa não pode ficar nem muito mole nem muito dura.
Cubra a massa com um pano e deixar crescer de um dia para outro.
No dia seguinte, acrescente os ingredientes opcionais e misture bem.
Enrole o pãozinho em uma superfície polvilhada o tempo todo com farinha de trigo. Deixe crescer por um mínimo de cinco horas.
Leve ao forno, em temperatura moderada, durante meia hora.
Rende 24 pães.

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