Tivesse ocorrido em alguma rua de um bairro na Zona Sul, provavelmente nossa imprensa, demonstrando indignação, clamaria por segurança pública. Veríamos uma cobertura com depoimentos, imagens, talvez resultasse até em capa. Mas aconteceu de o arrastão ser no Engenho de Dentro, subúrbio, e não mereceu mais do que notinhas – como as que vi no RJ TV, jornal O Globo e na internet.
No último sábado, 21 de fevereiro, pouco antes das oito da manhã, oito bandidos armados bloquearam, com três carros e uma motocicleta, a esquina das ruas Dionísio Fernandes e Borja Reis. Roubaram dinheiro, joias, documentos e celulares de motoristas e pedestres e depois fugiram. A ocorrência foi registrada na 26ª DP (Todos os Santos).
Apesar de ter acontecido no início da manhã de sábado, só na terceira edição do jornal O Globo de domingo o arrastão foi noticiado. Lá no pé da página 15. Como meus pais moram nas redondezas, avisei a minha mãe, que não sabia de nada.
Em plena época de Carnaval, saindo apenas em notinhas esparsas, certamente muita gente não foi informada do arrastão. Até porque, pra que noticiar, não é mesmo? Quem se importa com criminalidade no Engenho de Dentro? Aliás, quem sabe onde ficam ou já ouviu falar em Dionísio Fernandes e Borja Reis? Afinal, o que se espera do subúrbio é que seja assim mesmo e que seus moradores já estejam mais do que acostumados - e conformados – a viver em uma região que, como canta Chico Buarque, “não figura no mapa”, “é labirinto” e “não tem turistas” nem “sai foto nas revistas”. Quem mandou morar mal, não é o que dizem?
terça-feira, 23 de fevereiro de 2010
Soube do arrastão no Engenho de Dentro?
Subúrbio
Chico Buarque
Lá não tem brisa
Não tem verde-azuis
Não tem frescura nem atrevimento
Lá não figura no mapa
No avesso da montanha, é labirinto
É contra-senha, é cara a tapa
Fala, Penha
Fala, Irajá
Fala, Olaria
Fala, Acari, Vigário Geral
Fala, Piedade
Casas sem cor
Ruas de pó, cidade
Que não se pinta
Que é sem vaidade
Vai, faz ouvir os acordes do choro-canção
Traz as cabrochas e a roda de samba
Dança teu funk, o rock, forró, pagode, reggae
Teu hip-hop
Fala na língua do rap
Desbanca a outra
A tal que abusa
De ser tão maravilhosa
Lá não tem moças douradas
Expostas, andam nus
Pelas quebradas teus exus
Não tem turistas
Não sai foto nas revistas
Lá tem Jesus
E está de costas
Fala, Maré
Fala, Madureira
Fala, Pavuna
Fala, Inhaúma
Cordovil, Pilares
Espalha a tua voz
Nos arredores
Carrega a tua cruz
E os teus tambores
Vai, faz ouvir os acordes do choro-canção
Traz as cabrochas e a roda de samba
Dança teu funk, o rock, forró, pagode, reggae
Teu hip-hop
Fala na língua do rap
Fala no pé
Dá uma idéia
Naquela que te sombreia
Lá não tem claro-escuro
A luz é dura
A chapa é quente
Que futuro tem
Aquela gente toda
Perdido em ti
Eu ando em roda
É pau, é pedra
É fim de linha
É lenha, é fogo, é foda
Fala, Penha
Fala, Irajá
Fala, Encantado, Bangu
Fala, Realengo...
Fala, Maré
Fala, Madureira
Fala, Meriti, Nova Iguaçu
Fala, Paciência...
Escrito por Renata às 5:00:00 PM
Marcadores: arredores, desabafo, Grande Méier, opinião, personalidades
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2 comentários:
Talvez não moramos mal, apenas não viramos notícia nem encontramos os turistas. Amo o Méier e espero realmente providências quanto a Segurança. Q este post sirva de apelo.
Beijos
Ingrid, o "morar mal" foi mais um misto de provocação e desabafo, porque, afinal, não importa qual seja o CEP, todo mundo deveria ter direito a condições adequadas de vida. O nosso dinheiro, que paga o nosso IPTU, não é diferente do de quem "mora bem", né, apesar de haver quem pense o contrário.
Obrigada por comentar!
Bjs.
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